A doce ilusão de que ter um filho pode salvar o casamento
Filho não salva, garante ou segura casamento, contrariando o que há no imaginário de muita gente e em quase todos os dramas que assistimos na TV
A vida não é enredo de novela em que o mocinho fica preso à vilã boa parte da trama porque ela inventa estar grávida. Filho não salva, garante ou segura casamento, contrariando o que há no imaginário de muita gente e em quase todos os dramas que assistimos na TV.

Salvo os casos de casais que se anulam e se negam separar pensando estar beneficiando os filhos, criança nenhuma consegue fazer colar uma relação já quebrada. Embora neste primeiro caso também não haja resolução do problema, apenas cortina de fumaça.
Aliás, posso dizer com toda certeza que o nascimento de um bebê pode ruir de vez uma relação já comprometida e até mesmo colocar em xeque o mais saudável casamento.
A ideia romantizada de que a gravidez é uma boa cartada para tentar renovar algo falido acaba se tornando o início de vida de uma mãe solo.
De acordo com estudo feito no Reino Unido em 2019, um quinto dos matrimônios acabam no primeiro ano do bebê. Sabe por que isso acontece? Porque criar filhos é missão árdua, muito distante de ser parceiro de cerveja e viagem. Não que a vida a dois seja só isso, mas…
Ter filho é labuta, nada tem a ver com cineminha em dia de semana e churrasco sábado à noite. Ter filho é responsa, diferente de acordar a hora que quiser depois de uma noite inteirinha de sono no modo conchinha, compartilhar série, escolher simplesmente jantar pizza sem sequer ter “comida de verdade” à mesa.
Ter filho é perder a autonomia enquanto casal, pelo menos temporariamente. Nada mais é calculado a dois e, como já estamos cansadas de falar, é jogar ainda mais luz sob a disparidade na divisão de tarefas entre homem e mulher, agravado pelo fato de que há de se dedicar no criar, educar, formar outro ser humano.
Ter filho não é apenas sair da zona de conforto… É a perder de vista! E, olha, é preciso elevar o amor a outro patamar quando se vive no limite da exaustão. Saber ler os sinais vitais do sentimento que, por vezes, não tão raras quanto gostaríamos, parece ter entrado em choque anafilático.
A forma de se comunicar muda. Os corpos, as mentes e (por que não?) os objetivos. Na teoria o formar uma bela prole é uma coisa, na prática outra. A rota pode ter que ser recalculada mais de uma vez e aí os caminhos, antes a dois, se desencontram.
Existe a parte bonita? Claro! Apresentar ao mundo um ser humano vindo de duas pessoas que se amam pode ser uma das coisas mais simbólicas que existe numa relação, porém, entretanto, todavia, sem essa parceria forte, sem sincronia, sem os dois estarem igualmente despidos de egoísmos e entregue ao cuidado com seus rebentos, além de harmonizar todo o resto, sinto muito em dizer, não há amor que resista.