Círculos de Paz: alternativa para combater a violência nas escolas
Prática é usada no ambiente escolar para solucionar conflitos por meio do diálogo
A ocorrência de brigas nas salas de aula, violência entre estudantes nas saídas das escolas e conflitos que podem resultar em consequências graves são um desafio constante para educadores e gestores de instituições de ensino, sejam públicas ou privadas. A comunicação violenta pode culminar em problemas como bullying e outras agressões.
Como discutido em edições anteriores desta coluna, assim como a comunicação pode ser a razão de um conflito, ela também pode ser uma ferramenta poderosa de resolução.
Uma abordagem promissora para solucionar esses problemas é a prática dos Círculos de Construção de Paz, parte do programa de Justiça Restaurativa, que prioriza o diálogo como meio de promover mudanças sociais. Essa metodologia pode ser aplicada em diversos contextos: no ambiente de trabalho, em conflitos familiares, no acolhimento de migrantes, no apoio a vítimas de violência doméstica, na cura de traumas e na prevenção de assédio, sempre buscando uma nova forma de se comunicar e se relacionar.
Nesta coluna, o foco será nas escolas, onde essa técnica é utilizada para fomentar empatia, diálogo e respeito, contribuindo para a redução da violência, evasão escolar e bullying.
O que são os Círculos de Paz?
Os Círculos de Paz são um processo estruturado que organiza a comunicação em grupo, facilitando a construção de relacionamentos, a tomada de decisões e a resolução de conflitos de maneira eficiente. Esse método da Justiça Restaurativa é baseado em um processo colaborativo e pacífico, com o objetivo de permitir que cidadãos, grupos representativos e a sociedade em geral resolvam seus próprios problemas por meio do diálogo, promovendo a reparação de danos e a reconstrução das relações sociais afetadas pelos conflitos.
Esses círculos podem ser realizados em uma variedade de ambientes, incluindo escolas, igrejas, empresas, hospitais, centros comunitários, e outros espaços de convivência que busquem construir a paz. A aplicação preventiva dos Círculos é especialmente eficaz, pois evita que questões simples, que poderiam ser resolvidas com diálogo, se tornem processos judiciais. No Tribunal de Justiça de Mato Grosso, o Núcleo Gestor da Justiça Restaurativa (NugJur) é responsável pela formação de facilitadores.

Como funcionam os Círculos de Paz?
O diálogo é regulamentado pelo ‘objeto da palavra’, que permite que cada pessoa, ao segurá-lo — que pode ser qualquer objeto, como uma caneta — escolha falar ou permanecer em silêncio, sem ser interrompida. Ao decidir se pronunciar, o participante é ouvido e respeitado pelos demais, que aguardam em silêncio sua vez de falar. Assim, o respeito é a base do círculo.
Esse formato promove liderança compartilhada, pertencimento, igualdade, conexão, empoderamento e responsabilização. Ele reúne pessoas, proporcionando a cada participante a chance de falar, ouvir e ser ouvido em um ambiente seguro e respeitoso. Os participantes podem identificar danos e necessidades, abrindo espaço para entendimento e a restauração de laços.
Círculos de Paz nas escolas
Como principal ferramenta do ‘Programa de Pacificação Social nas Escolas’, os Círculos de Paz têm se destacado como uma prática restaurativa promovida pelo Poder Judiciário de Mato Grosso, contribuindo para a construção de ambientes escolares mais acolhedores e abertos ao diálogo, sensíveis às dores do outro. Nas escolas, essa técnica atua na prevenção de conflitos, criando espaços de convivência harmoniosa e propícios ao tratamento de questões comportamentais.
Além de resolver conflitos através do diálogo, a metodologia tem mostrado resultados significativos na redução da evasão escolar e na melhoria das relações entre alunos, professores e a comunidade. Focando na criação de ‘Escolas Restaurativas’, a Justiça Restaurativa acredita que a integração social se constrói por meio das experiências vividas no ambiente escolar.
Resultados obtidos em escolas de Mato Grosso demonstram que a técnica é capaz de contribuir para um ambiente escolar mais pacífico e inclusivo. Um exemplo é o uso dos Círculos de Paz na rede municipal de Várzea Grande, onde a inclusão de crianças migrantes, em sua maioria venezuelanas, foi promovida.
Muitos desses alunos se sentiam excluídos por dificuldades de comunicação. Com a implementação dos Círculos, estudantes de 11 a 15 anos puderam expressar suas angústias e necessidades, promovendo um sentimento de pertencimento à comunidade.

Katiane Boschetti da Silveira, pedagoga e ex-integrante da equipe técnica do Programa Escola+Paz de Porto Alegre (RS), é a responsável técnica pelo Programa de Formação do Núcleo Gesto da Justiça Restaurativa (NugJur), do Tribunal de Justiça de Mato Grosso.
Ela destaca um caso em que os Círculos de Paz foram essenciais para resolver uma situação de violência em uma escola. Duas adolescentes da mesma idade tinham brigado na saída da escola, uma delas usava soqueira e acabou ferindo a outra. Depois do Boletim de Ocorrência na Polícia, o caso foi enviado para a Justiça Restaurativa. A que bateu disse que, no dia anterior, tinha apanhado e que havia mais quatro jovens envolvidas.
Katiane destaca que, com o Círculo de Paz, é preciso olhar de forma mais abrangente para a situação. Com a participação de representantes da escola, familiares e das alunas envolvidas, todos tiveram a oportunidade de discutir e refletir sobre a situação, resultando em um acordo que evitou novos episódios de violência.
Este foi mais um exemplo de como a prática dos Círculos de Paz não apenas resolve conflitos, mas também promove um ambiente escolar mais saudável e colaborativo, reafirmando a importância do diálogo na construção de uma comunidade mais unida e respeitosa.
Como solicitar os Círculos de Paz?
Em Mato Grosso, escolas, instituições e organizações sociais podem procurar pelos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) nas comarcas ou acessar o site e clicar em ‘Solicitar um Círculo”.
Em Mato Grosso do Sul, o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec) conduz as ações de Justiça Restaurativa.