“Livrai-me do mal”: deixe sua oração ser ouvida
Por que fazemos tanto esforço para manter por perto pessoas que simplesmente não merecem ficar?
Sempre que uma determinada pessoa sair abruptamente da sua vida, ou um relacionamento qualquer acabar, vai ter alguém para te dizer: “Foi livramento”. Você já parou para pensar no que isso realmente significa?
Ser humano gosta de terceirizar as coisas – responsabilizar o destino, seu signo ou os planos de Deus pelo que acontece. Se você pedir alguma coisa, desejar, atrair, e ela acontecer, é o que foge à regra do que está escrito. Neste caso, sua intervenção mudou o curso das coisas.
E se numa dessas, você pede para alguém sair da sua vida e a pessoa realmente sai, quão difícil é agradecer pela graça alcançada permitindo que ela se desligue de você e simplesmente vá embora?

Se você deseja tão intimamente a ponto de pedir para sair de uma relação, de um emprego, de uma situação familiar, de um casamento, por que te fere tanto juntar suas coisas e simplesmente ir embora? Por que você sofre tanto quando a pessoa indesejada resolve ir?
Ontem ouvi algo que me pegou muito: “Se você pede para ser livrada do mal, então deixe sua oração ser ouvida”. Quando algo ou alguém, um projeto, um amor, uma amizade, um comecinho de sonho, se desfaz numa nuvem de pó (ou decepção) diante dos seus olhos, sua primeira reação não é agradecer.
A gente se sente lesada pela vida. Nosso apego às coisas e pessoas é tão gigantesco que seguramos dentro da mão fechada um ramo de urtigas, ainda que esteja queimando, ainda que esteja doendo.
Praticar o desapego é uma rotina horrorosa, é aquela colherada de óleo de rícino, é a dipirona oleosa e amarga goela abaixo. Que exercício terrível é abrir a mão e simplesmente deixar ir. É soltar o fio do balão, virar as costas e sair andando, sem espiar por cima do ombro até onde ele consegue voar sem você.
Já parou para pensar que a vida pode estar tentando arduamente livrar-te do mal, mas você não deixa? O namoro ruim, a pessoa possessiva, o relacionamento cheio de brigas, a amizade tóxica, o trabalho que infelicita, a pessoa que não te valoriza, por que você não deixa o rio da vida levar embora? É o cobertor encardido e fedorento que a gente insiste em não deixar ninguém botar fora, mesmo que te ofereçam um novinho em folha no lugar.
Acaba de conhecer uma pessoa que tinha tudo para dar certo, botou aquela expectativa marota em cima da criatura, e de repente ela sumiu?
Se esse relacionamento não seria bom, se vocês não eram compatíveis, se as divergências de hoje virariam brigas horrendas no futuro, você não sabe nada disso e está reclamando uma perda que nem chegou a ser um ganho?
O cara que você gostava se engraçou com outra e vazou? Seu namorado resolveu terminar depois de 15 anos te enrolando?
Você descobriu a enésima traição do seu marido? Por que diabos você não deixa essa pessoa ir embora, depois de tanto pedir por uma vida de paz?
O apego é o maior erro do ser humano, e um dos mais difíceis de se deixar de cometer. Somos criaturas acostumadas a escassez, a ter pouco, e esse pouquinho parece o mundo todo para você, mesmo que não baste. É como esperar que uma única batata alimente um batalhão de famintos.
Entender o livramento leva tempo. Sua primeira reação é a autopiedade, uma outra coisa que ser humano adora sentir. Confie no passar dos dias, na sábia ação do tempo que coloca tudo no lugar.
Um amigo de muitos anos costuma dizer que o tempo é a estrada esburacada por onde passa o caminhão de melancia, é o balanço que faz a carga se acomodar.
Quando a vida der uma daquelas guinadas e alguém ficar para trás, aceite como uma resposta. O que não te faz bem, não te faz crescer. Se não engrandece, te enfraquece. Ponto.
Se for embora não é perda, é a sua resposta.
Deixe que a vida te livre do mal. E amém.