Mulheres no esporte: Brasil é ouro com elas
Rebeca, Beatriz, Rayssa, o que as Olimpíadas dizem sobre nós?
Como boa criança da geração 80, cresci sabendo que nasci no país do futebol. Vivi a Copa de 1994, de camisetinha do Brasil e tudo, habituada a esperar a vitória em cada jogo da seleção. Sempre amei Fórmula 1, acordava no domingo só para ouvir a música do Senna vencendo mais uma. Na Olimpíada de 1992, vibrei com o ouro do vôlei masculino como se fossem meus primos. Mas eu também sabia quem eram Hortênsia, Magic Paula e Janeth.

Ao longo dos últimos 40 anos acompanhamos uma bela escalada das mulheres no esporte, e não falo do número de atletas ou de sua competência, falo do espaço. Quando eu era criança havia uma sensação de que as mulheres estavam nos mundiais sim, mas suas vitórias não costumavam parar o Brasil. O protagonismo real no esporte era dos homens.
Eis que chagamos às Olimpíadas de 2024 e as mulheres deram um show de excelência, e não apenas em esportes considerados pelos machistas de plantão como “coisa de mulher” como a ginástica artística, mas também no skate, no judô e inclusive no futebol. Afinal, elas pararam o Brasil. E geraram um buzz gigantesco, os posts de apoio e memes ferveram as redes sociais ao longo de dias.
Antes que você me acuse de promover a guerra entre os sexos (me causando uma revirada de olho cheia de ranço por essa visão tão tacanha a respeito de uma análise tão óbvia) é importante lembrar que essa ascensão passa por incentivo, competição, patrocínio, desafios de saúde física e mental, e uma luta enorme contra inúmeros fatores para permanecer no esporte.
Quando comemoramos a medalha de uma Rebeca Andrade, aplaudimos uma atleta excepcional, e é importante botar nessa conta as dificuldades e privações que ela já enfrentou: pobreza, preconceito, saiu da casa da mãe aos 9 anos para se dedicar integralmente ao esporte. Teve a maturidade que muito adulto não tem.
O ouro de Bia no judô veio carregado de declarações sobre seu corpo. Quantas meninas gordas desejam praticar esportes e não o fazem porque se sentem inadequadas? Porque alguém diz que não servem? Bem, Bia veio provando que no esporte certo, seu corpo é motivo de aplauso e não de vergonha.
Quanto significado existe em ver Rayssa, tão jovem, despontar no skate com tanta maestria? Estamos falando de skate, um esporte em que até ontem, as meninas eram expulsas das pistas. Essa ninguém me contou, eu vi acontecer.
Durante muitos anos, a prática de esportes era uma espécie de protocolo curricular, para não reprovar em Educação Física na escola. Os alunos magros, altos e com boa aptidão para corrida eram lapidados como talentos, e mesmo que não se tornassem atletas profissionais, teriam uma relação muito mais saudável com o esporte. Aos demais, sobrava o entendimento de que o esporte talvez não fosse a sua praia. Um erro, para quem já sabe a importância vital da atividade física para o hoje, e especialmente, para o amanhã.
É lindo ver que de repente o Brasil parou para aplaudir essas meninas. No mapa de medalhas olímpicas elas são a maioria, e isso nos diz sim alguma coisa. Esse quadro é completamente diferente do que vivemos em 1996, por exemplo. Significa que elas estão mais seguras para ocuparem esse lugar, inclusive em esportes que até ontem eram majoritariamente masculinos.
O reflexo disso é a enxurrada de meninas desejando praticar esportes, procurando seus ginásios, quadras, pistas, tatames e piscinas. Isso só pode ser muito, muito positivo.
Como uma mulher que não teve a chance de praticar o esporte que gostaria quando era menina, também eu resolvi me dar essa chance agora. Aos 40 anos finalmente comecei a lutar Karatê. Muito mais para a mente do que para o corpo, o esporte entrou na minha vida com joelho estragado e tudo, e não me importo. O sentimento que move as mulheres no esporte é um tipo de superação muito refinada, muito profunda.
No momento em que escrevia esse texto, Rebeca Andrade se transformava na maior medalhista olímpica do Brasil, conquistando seu merecidíssimo ouro ao som de Anitta, sendo reverenciada por duas atletas americanas no pódio.
É isso, meninas. É isso.