O amor não é um favor

Receber afeto de outro ser humano não é um pagamento pelo seu bom comportamento, nem uma compensação por mudar e tornar-se um ser idealizado por outra pessoa

O amor não é um favor que te fazem!
Vou repetir essa frase:
O amor não é um favor que te fazem.
Não é caridade, não é benevolência, o amor não nasce da pena. Ninguém deve te amar em troca de você se tornar uma pessoa que não é.

Isso pode parecer muito emblemático, então vou trocar em miúdos:

Quando a gente ama (ou acha que ama) e se envolve com alguém, o lado narcisista VAI aparecer – todo mundo tem um. Alguns são dominantes, outros não, e normalmente é assim que eles se estabelecem, um acaba se sobressaindo. Os relacionamentos que dão certo são compostos por pessoas que sabem controlar seu ego e adaptar-se de forma serena até onde é possível ir, 50% a 50%, sem renegar sua própria existência até ali, em nome de um sentimento que existe hoje, amanhã pode não existir mais.

Se você tiver que renegar a mulher que é e assumir uma nova personalidade, considerada digna de ser amada por outra pessoa, tem que pensar na possibilidade de precisar voltar por esse caminho. Se esse amor acabar, você vai se perder no personagem e não restará alternativa a não ser reencontrar a mulher que era. E se essa identidade estiver tão apagada pelo afeto em pagamento, a ponto do seu próprio mapa se perder?

É normal a gente se adaptar a outra pessoa quando topa começar um relacionamento, é nesse processo que, inclusive, melhoramos em muita coisa, crescemos, nos desafiamos a ir mais longe, ainda que para atender uma expectativa além da nossa. O problema é quando começa o “Não tem como gostar de você desse jeito” ou o “Você não é mais a pessoa que eu amava”. E aí, quem é você ao final desse processo? Se a condição para ser amada for ser uma outra pessoa, qual será sua escolha?

Vou dar um exemplo simples: você fez faculdade e sempre quis ser empreendedora, gosta de ter seu dinheiro e ser independente. Casou, teve bebê e esse sonho ficou para depois, hoje sua vida é em função de cuidar de casa e de criança, e seu marido não quer que trabalhe fora. A cada dia que levanta da cama para fazer comida e lavar banheiro, a parte de você que tinha sonhos não te questiona? Ela não te cobra, lá no fundo, que o caminho para vocês não era esse? Sim, a vida pediu e você se adaptou, escolheu cuidar. Mas se um dia esse marido for embora, você vai saber o caminho para reencontrar aquela empreendedora talentosa e recomeçar sua vida?

O amor não pode te cobrar tão caro a ponto de enterrar seus sonhos e não adaptá-los ao relacionamento. Começou a namorar faltando 2 meses para o intercâmbio e pensou em desistir? Ele prefere as loiras e te sugeriu clarear o cabelo para ficar mais bonita? Ele não gosta de mulher escandalosa e te sugeriu rir mais baixo? Usar roupa mais comprida? Diminuir o decote? Ele pediu que você deixe de conviver com os amigos homens? Fala que você não aceita o que ele diz?

Quer sentir a diferença?

Experimente se relacionar com um homem que te sugere fazer um curso de idiomas, uma pós-graduação, uma oficina online de atualização, uma viagem com sua filha adolescente. Se adapte para ter o amor de um cara que pegue a própria poupança e invista no seu pequeno negócio e te apoie nos dias que quiser desistir, que fique feliz em te ver ganhando dinheiro, com a criança numa boa escola e uma diarista bem remunerada cuidando da casa. Se adapte ao cara que te admira e te exalta como você é, com qualquer manequim, divertida, brilhante, ocupando espaço no mundo. O cara que te respeita como é, não vai pedir que você mude para caber na forminha que ele te oferece.

O amor não é um pagamento por bom comportamento.
Amor é um lutando pelo outro, é escolher dividir os dissabores da vida e nos raros intervalos, comemorar vitórias com quem se importa. É andar por essa vida respeitando a história do outro, sua natureza e seu passado. Não é sonhar a mesma coisa, é ter espaço para que cada um realize seus próprios sonhos.
Amor é como um laço de linha de costura. Ele efetivamente existe, mas a maioria das pessoas precisa de outra pessoa para enxergar.