Os perigos do improviso
Planejar a fala pode evitar mal-entendidos e crises por falha na comunicação
Há os que acreditam que falar de improviso, sem planejar nada, é a prova maior de que a pessoa sabe se comunicar bem. É verdade que grandes comunicadores, muitas vezes, têm uma enorme capacidade de falar sem estar com anotações em mãos, sem precisar usar slides numa tela, sem precisar de um teleprompter (aparelho acoplado nas câmeras onde é possível ler textos). Mas falar sem recorrer a esses mecanismos de apoio requer, sim, planejamento e estudo do conteúdo, para evitar escorregões que podem comprometer a comunicação e até mesmo gerar crises.
Em um dos seus livros, o experiente jornalista Heródoto Barbeiro traz orientações importantes para quem precisa falar em público, seja em palestras, reuniões ou entrevistas. E uma dica importante é não improvisar. “Aceitar falar de improviso é um risco até em uma festa de aniversário (…). Não se esqueça de que o melhor improviso é aquele que foi bem planejado”.
E para planejar é essencial dominar o assunto, ter as informações claras em mente para que sejam repassadas também de forma objetiva. Com domínio do conteúdo, é preciso definir quais são os pontos mais importantes da fala, que devem ser reforçados. Criar frases de efeito, citar metáforas ou analogias são recursos úteis, desde que bem usados, em situações que ajudem a explicar algo e não para gerar confusão.
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São inúmeros os casos de crises surgidas após falas improvisadas e analogias mal-sucedidas. Vamos aqui relembrar dois deles.
Em agosto de 2007, o presidente da Philips para a América Latina, Paulo Zottolo, falou durante entrevista a um jornal de circulação nacional que “se o Piauí deixar de existir, ninguém vai ficar chateado”. Imagine o tamanho da ira dos piauienses, que ameaçaram boicotes a produtos fabricados pela empresa holandesa. O governador do Piauí à época, Wellington Dias, exigiu uma retratação pública após a frase. Foram necessários telefonemas e notas na imprensa com pedidos de desculpas por parte da empresa para amenizar o estrago. Paulo Zottolo contou que a intenção foi falar do “marasmo cívico” do Brasil e reconheceu que errou feio ao fazer a comparação infeliz.

Infelicidade também do ex-técnico da seleção brasileira de futebol Luiz Felipe Scolari que, em novembro de 2012, criou uma crise institucional depois de uma fala improvisada. Quando questionado durante uma entrevista sobre a rotina dos jogadores, Felipão soltou: “se não quer pressão, vai trabalhar no Banco do Brasil”. Desnecessário dizer sobre a repercussão entre bancários do BB e as inúmeras notas de repúdio que vieram na sequência. O técnico pediu desculpas em público, marcou encontro com o presidente do Banco, tentou explicar diversas vezes que não teve intenção de ofender os bancários, mas o episódio demorou para ser esquecido.
Se formos buscar outros casos mais recentes de falas de autoridades que foram mal planejadas e geraram crises, serão intermináveis os exemplos para reforçar a dica: planeje a fala, pense antes de soltar a primeira frase de impacto que lhe der na telha. Muitas dores de cabeça poderão ser evitadas
Seja em palestras, entrevistas, eventos públicos, a principal orientação é planejar o conteúdo, estudar, criar um roteiro, pensar antes de falar. Qualquer pessoa está sujeita a “brancos” e ao nervosismo, que são obstáculos para falar bem e passar credibilidade. Até mesmo para essas situações desconfortáveis é preciso pensar no que falar. O melhor é saber que, assim como em outras coisas na vida, tudo tende a melhorar. Quanto mais a pessoa fala em público, mais fáceis as coisas vão se tornando, menos chances de cair nas armadilhas do improviso.