Só as mães são felizes?
Frase do eterno poeta Cazuza saiu do tom
Amo Cazuza. Embora tivesse seus privilégios de pobre menino rico e branco, é inegável que Argernor de Miranda Araújo compôs e entoou críticas ácidas que fazem até hoje total sentido, sempre com o futuro repetindo o passado. Mas, meu querido poeta, numa coisa discordamos, ao contrário do que escreveu, nem só as mães são felizes.

Pois é. A música Só as Mães São Felizes não só foi cantada, como também intitula a biografia do artista. Claro, talvez pela dedicação de sua mãe Lucinha, com a qual o rebelde teve inúmeras desavenças, porém foi quem o acompanhou até o fim.
Mas, vamos lá! Tirando este sentimentalismo, podemos dizer que mesmo um cara tão a frente do seu tempo, fez o que a sociedade traz ao longo da história: mediu todas as mulheres pela régua da maternidade. Ok. A letra em si não diz respeito diretamente ao tema, me baseio, então, nessa frase para te convidar à reflexão.
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Num pequeno conjunto de palavras, ele associou a felicidade de milhões de mulheres que povoam o mundo ao fato de ter filhos. Óbvio que para algumas de nós, ser mãe é sinônimo da mais pura e completa felicidade, no entanto, para muitas outras, ter filho é mais uma delas. Que completa a vida como um todo.
Indo além, dizer que só as mães são felizes é ainda mais cruel quando focamos em milhares de mulheres que jamais serão mães por N motivos, inclusive, que vão além da própria vontade. E aí? Será que cravar que elas estão fadadas à infelicidade eterna não é, no mínimo, arrogância?

Outra coisa, importantíssima, diga-se de passagem, você já viu alguém falar a um homem “você só vai ser feliz quando for pai?”. Aposto que não!
A felicidade masculina está redondamente ligada à carreira. Nada de casamento ou filhos, e sim êxito profissional.
Eu sei, eu sei, lendo assim parece um cenário tão obsoleto! Só que, na prática, mesmo em pleno século 21, o discurso segue tendo esse viés.
Filhos são felicidade, claro! Para quem os tem e não é regra. Mulheres que não escolheram ou não vão trilhar este caminho são totalmente capazes de serem felizes em incontáveis nuances da vida.
Então, me desculpe, Cazuza, a música é uma crítica sensacional, mas essa frase saiu do tom.