Pantanal vive 2ª maior seca desde 1985 e moradores recorrem a cisternas
Segundo o levantamento, a área com água no bioma caiu para 366 mil hectares, o que representa 52% a menos do que na última grande cheia registrada em 2018
O Pantanal brasileiro teve, em 2024, o segundo ano mais seco desde o início da série histórica do MapBiomas, em 1985. A superfície de água no bioma – que abrange os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul – recuou 4% em comparação com o ano anterior. O dado foi divulgado nesta quinta-feira (20) e acende o alerta sobre o equilíbrio ambiental da região.
Segundo o levantamento, a área com água no bioma caiu para 366 mil hectares, o que representa 52% a menos do que na última grande cheia registrada em 2018. Ou seja, há sete anos o Pantanal não alaga completamente, o que compromete o chamado pulso de inundação — os ciclos naturais de cheia e seca, essenciais para renovar a biodiversidade.

“O pulso de inundação é o que traz alimento, renova a vegetação e mantém o equilíbrio do bioma. Sem ele, a fauna e a flora sofrem, e o Pantanal se torna mais vulnerável”, explica Eduardo Reis Rosa, pesquisador do MapBiomas.
A média de chuvas no Pantanal, que costuma ser de 1.100 mm por ano, não tem sido alcançada nos últimos cinco anos, segundo o Serviço Geológico do Brasil (SGB).
“Somando os déficits de chuva desde 2020, o bioma perdeu o equivalente a um ano inteiro de chuvas”, afirma Marcus Suassuna, pesquisador do SGB.
Ele destaca que 2024 já foi o pior ano da série histórica registrada pela estação de Ladário, com níveis de rio abaixo dos piores patamares já medidos, incluindo 1964, até então o recorde negativo.
Apesar das chuvas recentes, principalmente no norte do Pantanal, a água não está chegando em volume suficiente aos pontos cruciais da planície alagável. Sem o transbordamento do Rio Paraguai, a água vinda do planalto não é represada — ela apenas escoa, sem encharcar a região como deveria.
Com o pouco alagamento, há crescimento de vegetação rasteira e biomassa, que vira combustível natural assim que a seca retorna.
“No momento da seca, essa biomassa seca vira risco de incêndios severos, como os que já ocorreram em 2020 e 2024”, alerta Eduardo, do MapBiomas.
Suassuna reforça a semelhança com 2020, ano marcado por incêndios devastadores, e aponta que 2025 já apresenta características meteorológicas preocupantes.
No assentamento rural de Poconé, o produtor Francisco Tiago se emociona ao lembrar da mina d’água que abasteceu a família e vizinhos por mais de 30 anos — e que secou completamente nos últimos anos.
“Secou de uma vez. Chovia, mas não juntava uma gota. Nunca esperei uma seca dessas”, diz.
Ele relata que teve que recorrer a poço artesiano para manter a produção e garantir água para casa.
“O poço era o mais valente. Todo mundo da comunidade usava. Mas nem ele aguentou essa seca braba.”
Francisco também nota o impacto para os animais silvestres:
“Os bichos sofriam com sede. Sem fruta, sem água. Todo mundo precisa de água. Até formiga e marimbondo… e a gente, mais ainda.”
Pesquisadores e órgãos ambientais alertam que, caso o ciclo de secas se mantenha, o Pantanal pode sofrer impactos irreversíveis, com prejuízos à biodiversidade, turismo, agricultura e abastecimento.
“É preciso monitorar, preservar e se preparar para novos extremos. A seca não é mais exceção, é uma realidade frequente”, conclui Suassuna.