Infância - Como anda a saúde mental das nossas crianças?

A ansiedade e a depressão têm sido diagnosticadas cada vez mais precocemente; é mais cedo também que os jovens, muitos ainda quando crianças, têm tido experiências com drogas lícitas e ilícitas.

Todo ser humano vivo passou pela experiência infantil ou se encontra hoje nessa fase. A infância é um período da vida pleno de curiosidades, descobertas e novas aprendizagens a cada dia; a identidade forma-se e consolida-se ali. Apresenta-se com um comportamento mágico nos primeiros anos, que se torna lógico ainda na fase infantil. Passa a ser lógico, mas não deixa de ser lúdico, nem abandona de todo as fantasias.

Colunista Marcos Estevão fala sobre saúde mental infantil

Os sonhos, os mundos imaginários são importantes, até mesmo essenciais para o desenvolvimento emocional, afetivo e cognitivo que a criança vai levar à vida adulta. Amigos imaginários, personificação de animais, vegetais e até mesmo de objetos inanimados expandem a criatividade e a inteligência emocional do infante, permitindo uma interação social mais saudável.

O mundo mudou no decorrer do tempo, a vida mudou, a infância também sofreu mudanças. Antes a conexão da criança era sobretudo com outras crianças na vizinhança e na escola. A rua, a natureza, os quintais, as praças e os parques eram explorados, faziam parte da diversão infantil. Havia brinquedos e brincadeiras fora de casa, ao ar livre. A criança realizava muito com o pouco que tinha à mão, utilizava a criatividade nas diversões, desempenhava um papel consentâneo com a cultura da época.

Havia mais liberdade, até porque a segurança era maior, mas ao lado da liberdade havia mais responsabilidade. Algumas ajudavam os pais em casa, cuidavam dos irmãos mais novos e outras precisavam trabalhar fora para ajudar no sustento da família. Apesar disso, algumas conseguiam estudar e brincar apesar do trabalho. Outras, porém, por causa do trabalho, não conseguiam ir à escola e aproveitavam muito menos a infância com brincadeiras.

Hoje as leis mudaram, temos o estatuto da Criança e do Adolescente que prioriza a educação e proíbe corretamente o trabalho infantil. O ECA, porém, não se ateve à necessidade do viver lúdico com conexão social e estímulo a maior criatividade da criança. O desenvolvimento tecnológico atual monopoliza a atenção infantil, diminui a criatividade e o contato direto entre as crianças.

internet crianças Pesquisa mostra que 95% das crianças e adolescentes acessam internet. (Foto: Valter Campanato/ Agência Brasil)
Pesquisa mostra que 95% das crianças e adolescentes acessam internet. (Foto: Valter Campanato/ Agência Brasil)

Tudo vem pronto, infelizmente. Hoje vale a máxima de Lavoisier, discretamente modificada: “na natureza quase nada se cria, nada se perde, quase tudo se encontra feito”. O mundo digital faz parte do cotidiano infantil, tanto em seus aspectos positivos como auxiliar na educação e na comunicação; quanto negativos, não permitindo a relação presencial entre as crianças, estreitando o repertório de vida do infante e modificando as experiências infantis de hoje em relação às do passado.

Os pequeninos são expostos precocemente a conteúdos virtuais inadequados, com prejuízo ao desenvolvimento do comportamento e da afetividade, que vão manifestar-se no futuro da criança, ou seja, em sua fase adulta.

Hoje, nossos infantes estudam parte do dia e no outro período trocam o trabalho do passado por inúmeras atividades extracurriculares do presente. São aulas de língua estrangeira, atividades esportivas, geralmente mais de uma ao dia. Nos intervalos, dedicam-se aos seus smartphones e tablets.

À primeira vista, parece mais fácil do que antigamente, mas as pressões são maiores, o mundo já começa a ser competitivo desde essa idade da vida. Sobressai-se melhor quem faz mais esporte, quem estuda mais línguas estrangeiras, quem vai bem na escola, porque lá na frente a competição para um lugar na universidade é muito disputado. Tudo isso tem como consequência uma rotina estressante para nossas crianças.

A ansiedade e a depressão têm sido diagnosticadas cada vez mais precocemente; é mais cedo também que os jovens, muitos ainda quando crianças, têm tido experiências com drogas lícitas e ilícitas. Daí a necessidade de uma relação familiar saudável, pois não podemos esquecer que os pais são espelhos dos filhos. Diálogo e apoio emocional são essenciais para o desenvolvimento psíquico da criança. Pais e professores devem incentivar o comportamento lúdico do infante com e sem tecnologia. Habilidades sociais conquistadas auxiliam o desenvolvimento emocional infantil.

Precisamos ter em mente que, independente da época, ser criança é viver a imaginação sem limites, é exercer a curiosidade e a fantasia para brincar e explorar o mundo ao redor de si e isso precisa ser permitido a ela, porque só assim preservaremos sua saúde mental e a prepararemos para enfrentar os desafios da adolescência e da vida adulta.

Este conteúdo reflete, apenas, a opinião do colunista Saúde Mental, e não configura o pensamento editorial do Primeira Página.

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