Ao negar prisão, juiz diz que suspeita sobre delegado deve ser "amplamente investigada"

Mesmo sem considerar as provas reunidas na operação “Codicia” suficientes para colocar o delegado Patrick Linares da Costa na cadeia, o juiz Olivar Augusto Roberti Coneglian, da 2ª Vara Criminal de Campo Grande, defendeu a ampla investigação da conduta da autoridade policial em relação às suspeitas de existência de esquema de corrupção na 2ª Delegacia de Polícia Civil de Ponta Porã, que era chefiada por ele até segunda-feira (25), quando a ação foi deflagrada. Por isso, o magistrado negou pedido de prisão de Patrick na operação “Codicia”, mas decidiu afastar o servidor do cargo e impedir sua entrada na unidade policial e contato com os outros investigados.

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Trecho da decisão judicial em que o magistrado cita o delegado Patrick Linares da Costa. (Foto: Reprodução de processo)

Linares é delegado de polícia em Mato Grosso do Sul desde 2014 e segundo investigações do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) há indícios da participação dele no esquema, que envolvia escrivães, investigadores e um perito, além de pessoas suspeitas de ser o elo dos agentes de segurança com a criminalidade.

Para o juiz, as provas coletadas pelo Gaeco, por ora não deixam clara a participação do delegado, mas a situação merece ser amplamente investigada.

“Ainda que Patrick Linares da Costa eventualmente não tenha concorrido para a prática dos crimes agora em análise, não se pode deixar de lado que alegados fatos se deram no interior da Delegacia em que atua e é o principal comandante, o que exige, pelo menos em sede de cognição sumária, a aplicação de medidas cautelares para a garantia da ordem pública e para a conveniência da instrução criminal”, escreveu o magistrado.

“Se um titular de uma delegacia não participou dos alegados ilícios, mas se omitiu e permitiu que fossem praticados, sua conduta deve, no mínimo, ser amplamente investigada”, prosseguiu.

Leia aqui como fica a situação do delegado em relação ao concurso de juiz e a manifestação da defesa dele.

Na decisão em que negou o pedido de prisão de Linares, o magistrado afirmou que apesar das várias movimentações detectadas na conta dele e da esposa, nenhuma foi feita por Valdenei Peromalle, o policial tido como “contador” do esquema ilegal.

O juiz Olivar reforçou que os pagamentos podem ser consequência de negócios lícitos, como venda de imóveis. O magistrado também alegou que nas interceptações telefônicas não foram flagradas nenhuma conversa entre os outros investigados com Patrick, para rejeitar o pedido mais severo, de prisão.

Apesar de entender que não há nenhuma prova suficientemente forte para manter o delegado na prisão, afirmou que os indícios encontrados até o momento merecem uma apuração aprofundada, até mesmo pela possibilidade de omissão diante dos crimes cometidos dentro da unidade em que chefiava.

Para evitar qualquer interferência do delegado nas investigações, o juiz optou por definir medidas cautelares. Por ordem judicial foi afastado do cargo, proibido de entrar em qualquer delegacia do Estado e perdeu o direito de andar armado, mesmo com armas particulares.

Suspeitas

De acordo com a investigação, o grupo de policiais cobrava “taxas” para liberar veículos roubados ou furtados recuperados na cidade para as vítimas.

Há suspeita, ainda, de desvio de drogas apreendidas na região, que fica do lado do Paraguai, país que é um dos maiores fornecedores de maconha, além de corredor do tráfico de armas e contrabando.

Em ligações interceptadas, foi descoberto que os líderes do esquema eram os escrivães Valdenei Peromalle, conhecido como “Nei” e Jonatas Pontes Gusmão, o “Jhow”. Nei era quem conversava com as vítimas, pedia dinheiro para “agilizar” os serviços da unidade e ainda dividia os valores com os colegas que participavam do “negócio”, aponta a persecução investigória.

Durante as apurações, o Gaeco teve acesso as movimentações bancárias de todos os investigados e identificou várias transferências movimentações que estão sob suspeita.

O delegado Patrick também foi alvo da quebra de sigilo bancário.

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Delegado Patrick Linhares foi afastado do cargo nesta manhã (Foto: Ponta Porã Informa)

Para o Gaeco, a suspeição sob o delegado se funda nas diversas transferências encontradas na conta dele e da esposa, resultando em um valor recebido incompatível com a profissão do casal.

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Na conta de Linares, entre os anos de 2017 a 2019, foram recebidos R$ 17.060,00 por meio de 18 depósitos em dinheiro, sem identificação do remetente. Em nome da mulher dele, que é servidora do poder judiciário estadual, foram constatados 190 créditos, que somaram R$ 214.597,49, com algum tipo de identificação, além de R$ 89.980,00 sem remetente.

Outras provas da participação do delegado foram entregues a justiça para fundamentar o pedido de prisão de Linares. A investigação, conforme o Gaeco pontuou, só encontrou irregularidades na delegacia no período em que Patrick era titular da unidade.

Em uma das conversas interceptadas, Jhow afirma que o chefe não queria mais envolvimento com o esquema porque havia passado em outro concurso, para juiz.

De fato, Linares foi aprovado no último concurso para a magistratura do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul e deveria tomar pose nesta quarta-feira (25), mas depois da operação, teve a posse suspensa, com reserva da vaga de magistrado até o fim das apurações.

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