"Decretou morte", reagem colegas sobre advogado que detalhou "Sintonia dos Gravatas"

Vídeo dos 33 minutos de duração do depoimento à força-tarefa da Polícia Civil foi enviado a advogada que também está presa

Durou cerca de meia hora o depoimento do advogado Bruno Ghizzi, 30 anos, à força-tarefa da Polícia Civil, em 8 de julho do ano passado. Gravada em vídeo, como tem sido hábito em procedimentos policiais desse tipo, a fala foi parar com uma colega de advocacia delatada como integrante da “Sintonia dos Gravatas”, núcleo que é alvo da operação “Courrier”, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate Crime Organizado).

O vídeo passou a ser disputado, inclusive com propostas de pagamento de valor alto, para que chegasse até os cabeças da máfia atuante dentro e fora dos presídios. Quem vazou, para o Gaeco, foi o mesmo personagem que está na cadeia por permitir a Bruno Ghizzi acesso a sistemas sigilosos de informações.

Interceptação Inaiza
Trecho de interceptação mostra advogada contando que recebeu vídeo do depoimento de Bruno Ghizzi à Polícia Civil. (Foto: Canal Aberto)

Ghizzi e mais três colegas de profissão estão presos desde 25 de março, em decorrência dos indícios de participar da facção dominante nos presídios de Mato Grosso do Sul,  fazendo trabalho de “pombo-correio” e até de administração de valores advindos da criminalidade, entre outras tarefas fora do menu legal dos defensores.

No dia 7 de agosto de 2021 – um mês depois do depoimento – a advogada Inaíza Herradon, que foi presa na “Courrier”, conta a uma interlocutora, também advogada investigada, ter recebido o vídeo do depoimento de Ghizzi à Polícia Civil.

O clima da conversa é de “choque” com as declarações feitas pelo depoente. As duas advogadas concordam que Bruno “decretou a própria morte”, por ter detalhado como o grupo criminoso usa os serviços de advogados para se comunicar com pessoas de fora da prisão e, também, com os comparsas em outras cadeias.

É de conhecimento geral a violência empregada pela facção contra seus desafetos e inimigos.

As duas mulheres tratam como certa uma represália ao advogado quando o “comando” da facção soubesse tudo que ele disse.

Inaíza garante ter sido assediada por uma outra colega, igualmente sob suspeita de cumprir mais do que a função defensiva dos membros da quadrilha. Nas palavras dela, recusou-se a vender o conteúdo.

Mais à frente, explica que fez isso pensando no seu próprio futuro.

“Não vou vender a cabeça dos outros”, descreve o material investigativo sobre a declaração da advogada sobre o vídeo. “Se faz isso hoje, amanhã é a minha [cabeça] que está a prêmio”, justifica.

Bruno Ghizzi é taxado de “guri doido”, pelas afirmações que fez sobre a existência da “Sintonia dos Gravatas”.

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De onde veio o vídeo

No diálogo interceptado com autorização judicial, fica claro que quem repassou o vídeo a Inaiza foi o analista judiciário Rodrigo Pereira da Silva Correa, de 41 anos, outro que está atrás das grades por envolvimento no esquema.

Silva admitiu ter repassado a Bruno Ghizzi sua senha de acesso a sistemas oficiais de gerenciamento de dados pessoais e de processos.

Essa quebra de sigilo funcional já durava mais de ano, e só veio à tona quando Ghizzi usou os códigos para consultar prontuário de delegado de Polícia Civil integrante de força-tarefa que investiga o crime organizado no Estado e também responsável por investigar justiçamentos cometidos pela facção nos “tribunais do crime”.

Bruno Ghizzi e Rodrigo tentaram combinar uma versão de que o advogado teria visto a senha em uma anotação na estação de trabalho do analista judiciário e usado.

Mas no depoimento, acabou admitindo que o repasse foi voluntário e dando inúmeras outras informações à polícia, que alimentaram o trabalho investigatório.

Como os réus estão presos desde o dia 25, o Gaeco tem até o próximo dia 8 para fazer a denúncia contra eles.

Além de 4 advogados e de Rodrigo, um policial penal também está preso por colaborar com o esquema. Também são alvos detentos tidos como cabeças da facção e chefes dos advogados faccionados.

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