"Sintonia dos Gravatas": Gaeco corre contra o tempo para apresentar denúncia contra 10 presos

O Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado) tem até o dia 4 de abril, a próxima segunda-feira, para apresentar a denúncia contra as 10 pessoas presas na operação “Courrier”, deflagrada no dia 25 de março. A ação trouxe à tona as entranhas da convivência criminosa entre um grupo de advogados e a facção que age dentro e fora dos presídios de Mato Grosso do Sul, perpetrando ações violentas, dominando o tráfico de drogas e de armas, além de pagar propina a agentes públicos de segurança.

O que explica esse prazo é a regra legal que dá 10 dias para a apresentação formal à Justiça da acusação aos suspeitos de crimes que estão presos.

Operação Courrier
Viatura na frente de um dos locais de busca da operação “Courrier”. (Foto: Osvaldo Nóbrega)

Para sustentar a acusação, os promotores de Justiça do Gaeco estão analisando todo o material apreendido no dia da operação, quando foram cumpridos 38 mandados, entre prisões, busca e apreensão. Isso inclui extração de conteúdo armazenado em celulares, computadores, além de anotações encontradas nos endereços ligados aos suspeitos.

Na operação “Courrier” tiveram ordem de prisão expedida a pedido do Gaeco quatro advogados, um analista judiciário, um policial penal, uma mulher apontada como traficante e três presidiários ligados à facção.

Pelo menos uma dezena de advogados, além dos que foram presos, estão sendo investigados por integrar um grupo denominado de “Sintonia dos Gravatas”. A esse núcleo é atribuída a tarefa de “pombo-correio” dos presos faccionados e ainda de administrador de dinheiro em contas bancárias, entre outras funções fora da legalidade do trabalho do defensor. Um dos exemplos é a corrupção de agentes de segurança para a entrega de celulares aos detentos.

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“Salves” para atentados

Entre as comunicações ilegais, estão “salves”, ordens das por faccionados, relacionadas a planos de atentados a autoridades do Judiciário em Mato Grosso do Sul, de Goiás e de Minas Gerais. Os alvos são responsáveis por prisões e por mandar essas pessoas para regimes mais rígidos de custódia.

Na investigação aparece, inclusive, o nome de Marcos Willians Herbas Camacho, o “Marcola”, tido como o chefe nacional do grupo criminoso. Encarcerado no sistema prisional federal, ele estaria insatisfeito com as transferências de presidiários para locais com mais segurança e onde o isolamento é maior, como os presídios federais e, em Mato Grosso do Sul, o presídio de segurança máxima da Gameleira, a chamada “Supermáxima”.

Peças investigatórias

São duas investigações, com mais de 1,5 mil páginas, contendo elementos como transcrições de interceptações telefônicas. A primeira foi aberta em abril do ano passado, quando foi interceptada comunicação entre os internos da “Supermáxima”, com teor relacionado a ataques às autoridades.

Na época, o Gaeco encontrou determinações sobre os armamentos pesados que seriam usados para isso.

Na outra apuração, iniciada em julho do ano passado, foi descoberto que o grupo tinha a conivência de servidores do Judiciário, da Defensoria e do sistema penal estadual para obter informações sigilosas e fornecer aos bandidos, além de agir para beneficiar os condenados dentro do sistema penal.

Foi identificada, em julho de 2021, consulta envolvendo o nome de delegado de Polícia Civil, integrante de força-tarefa que investiga o crime organizado em Mato Grosso do Sul e responsável por inquéritos a respeito de execuções nos “tribunais do crime”, determinadas de dentro dos presídios.

A partir desse fato é que foram presos os quatro advogados e os dois servidores públicos e uma mulher ligada ao grupo fora dos presídios. Na cadeia, três detentos tidos como cabeças do esquema ilegal foram alvos de mandado de prisão.

Diante da gravidade das acusações, a OAB (Ordem dos Advogados) em Mato Grosso do Sul criou comissão específica para acompanhar a operação Courrier. A Agepen (Agência de Administração do Sistema Penitenciário) e a Defensoria Pública informou que também estão acompanhado os casos.

O TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) não se manifestou publicamente. O Primeira Página apurou que o analista judiciário foi afastado das funções e responde a processo administrativo, que pode redundar em sua demissão.

Bruno Ghizzi
Bruno Ghizzi está entre os advogados investigados sob suspeita de atuar como “pombo-correio” de facção. (Foto: Redes sociais)

Confira abaixo quem são as pessoas que tiveram prisão decretada na Courrier

  • Bruno Ghizzi, 30 anos, advogado.
  • Inaiza Herradon Ferreira, 37 anos, advogada.
  • Paula Tatiane Monezzi, 35 anos, advogada.
  • Rodrigo Pereira da Silva, 41 anos, analista judiciário, ex-chefe de cartório da 2ª Vara de Execução Penal
  • Jonathas Wilson Moraes Candido, 34 anos, policial penal lotado do presídio de segurança máxima do complexo do Jardim Noroeste, mais conhecida apenas como “Máxima”.
  • Kamila Mendes de Sousa, 27 anos, suspeita de tráfico de drogas.
  • Chistian Thomas Vieira, Tio Doni, custodiado no presídio de segurança máxima da Gameleira, a “Supermáxima”, em Campo Grande.
  • Edimar da Silva Santana, 39 anos, o “Arqueiro”, que cumpre pena no presídio federal de Mossoró (RN)
  • Douglas Silva Fonseca, 32 anos, interno da Máxima, em Campo Grande.