Tráfico usa helicópteros sem manutenção pra levar drogas na fronteira

Os detalhes de como a facção criminosa agia só foram descobertos após a prisão do grupo, em 2021; no centro das negociações está José Luís Martins Júnior

Helicópteros com “horas vencidas”, vindos de anos de uso em fazendas brasileiras, eram aproveitados pelo tráfico para o transporte de drogas entre Paraguai e Brasil. Essa é a constatação da Polícia Federal nas investigações que levaram para a prisão Anderson Meneses de Paula, o “Tuca”, e outras sete pessoas em Ponta Porã – cidade a 286 quilômetros de Campo Grande.

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Helicóptero apreendido pela Polícia Federal em operação realizada em agosto deste ano (Foto: Polícia Federal)

A ação que levou Anderson para a cadeia ocorreu em um domingo de 2021, caso raro dentro da Polícia Federal.

Conforme as apurações, “Tuca” recebeu a missão de assumir o controle do maior grupo criminoso na linha fronteiriça, mas quando veio a Mato Grosso do Sul já era monitorado pela polícia. Acabou preso antes de comandar os faccionados enquanto participava de um almoço na casa de José Luís Martins Júnior.

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Casa de José, onde os suspeitos foram presos pela polícia (Foto: Senad/ Paraguai)

Para a Polícia Federal, na época, José Luís era o responsável por negociar a venda da droga e quem deveria “ensinar” a dinâmica da fronteira para “Tuca”. Era ele quem comprava as aeronaves e cuidava do transporte aéreo de quilos e mais quilos de drogas.

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Os detalhes de como a facção criminosa agia só foram descobertos após a prisão do grupo. As provas estavam guardas no celular de José Luís.

“Após a apreensão e análise dos materiais arrecadados em posse de JOSÉ foi possível verificar que ele era uma pessoa muito mais importante e influente dentro da organização criminosa com as diversas negociações de tráfico de drogas relacionados com aeronaves”.

Segundo a polícia, “Brahma”, como era conhecido pelo grupo, mantinha contato com os pilotos e recebia o dinheiro pelos transportes em nome da facção. Para isso, tinha contas em casa de câmbio do Paraguai, tudo para dificultar as investigações da polícia.

No dia em que foi preso, José estava com uma identidade falsa e, por isso, também acabou detido em flagrante. Meses depois, prestou depoimento à Justiça e tentou explicar as provas encontradas pela Polícia Federal: se declarou um amante por aviação e negou ter qualquer envolvimento com o tráfico ou com o crime.

“Brahma” contou que o amor por aviação fez com que ele se tornasse referência para muitos fazendeiros da região de fronteira em Brasil e Paraguai. Explicou que, por conta das condições climáticas do Pantanal, os empresários começaram a trocar aviões por helicópteros, pela falta de pistas de pouso nas épocas de cheia.

Como ele entendia do assunto, passou a mediar compras e vendas de helicópteros e receber comissão por isso.

José revelou que as aeronaves possuem um “prazo de validade” medido pelo tempo de voo. No Brasil, depois desse tempo, a manutenção é obrigatória, mas o valor para isso corresponde a 80% de um helicóptero novo. Por isso, ele costumava orientar os fazendeiros a venderem as usadas e comprarem novas.

No Paraguai, no entanto, nada disso era fiscalizado, por isso, José negociava as aeronaves no Brasil e passava para fazendeiros com propriedades do país vizinho.

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Fotos de drogas foram encontradas nos celulares dos envolvidos no esquema (Foto: Retirado do processo)

Para a polícia, ele negou que os helicópteros eram usados para carregar droga. Falou que sequer voavam no Brasil, só para tirar essas aeronaves do país. Para isso, contratava pilotos que ainda não tinham licença ou que já haviam perdido a habilitação.

O principal deles era Laion André de Azevedo, piloto que, segundo a Polícia Federal, tinha “diversas ligações” com a facção paulista.

Nas investigações foram encontradas até transferências bancárias entre a mãe do piloto e a esposa de José. No depoimento, “Brahma” afirmou que os pagamentos eram pelas viagens com as aeronaves vendidas por ele e trazidas por Laion até o Paraguai.

Nos últimos três anos, a Polícia Federal apreendeu um helicóptero em Mato Grosso do Sul e 32 em todo o país, a maioria ligada ao tráfico de drogas.

Relação com Tuca

Outro ponto que José precisou explicar foi a relação com “Tuca”.

Ele afirmou que os dois tinham um amigo em comum, que meses antes da prisão ligou para ele e avisou que Anderson e a esposa estavam indo para Ponta Porã. Por consideração a essa pessoa, alegou ele, recebeu o casal em casa e manteve uma relação de colega.

No dia em que foram presos, a mulher de Anderson fazia aniversário e por isso ele convidou os amigos para um churrasco na casa dele. Mas pouco tempo depois, os policiais federais entraram na casa e prenderam todos que estavam lá. José ainda acusou as equipes de abuso de poder diante do juiz federal.

Nada do que ele disse convenceu a Justiça. José Luís foi condenado a 30 anos de prisão pela 1ª Vara Federal em Ponta Porã. “Tuca” teve a mesma pena. Assim como eles, todos os presos naquele dia foram condenados.

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